(quadro de emil nolde, "patient, doctor, death and the devil", 1911)
"Depois da minha experiência com os Simontons, com a ajuda da minha mulher, Bobbie, e de Marcia Eager, então enfermeira no meu consultório, iniciei um grupo de terapia chamado Pacientes de Cancro Excepcionais (ECaP), para ajudar as pessoas a mobilizar todos os seus recursos contra a doença. Adoptámos como manual o livro recentemente publicado dos Simontons, Getting Well Again, e enviámos centenas de cartas a doentes. A carta sugeria que os podíamos ajudar a viver melhor e mais tempo através das técnicas que os ECap lhes ensinaria. Esperávamos centenas de respostas. Pensávamos que todos os que recebessem uma carta falassem com mais alguns pacientes de cancro e os trouxessem à reunião. Afinal de contas, pensava eu, viver não é o que toda a gente quer? Não há tantos doentes que vão até ao fim do mundo à procura de todas as espécies de tratamentos alternativos que ofereçam um laivo de esperança? Comecei a enervar-me acerca de como lidar com a multidão que ia aparecer.
Apareceram doze pessoas.
Foi aí que comecei a aprender, em primeira mão, como são realmente os doentes. Descobri que há três tipos.
Cerca de quinze a vinte por cento dos pacientes, inconsciente ou mesmo conscientemente, querem morrer. A certo ponto saúdam o cancro ou qualquer outra doença grave como forma de escapar aos problemas através da morte ou da doença. São estes os doentes que não manifestam sinais de tensão quando conhecem o diagnóstico. Enquanto o médico batalha para os pôr bons, eles resistem e tentam morrer. Se lhes perguntam como estão, dizem: «Óptimo.» E o que os preocupa? «Nada.»
(...)
No meio do espectro de doentes situa-se a maioria, cerca de 60 a 70 por cento. São como actores que fazem um teste de audição para um papel. Actuam para satisfazer o médico. Agem consoante o que julgam que o médico quer, na esperança de que assim o médico faça o trabalho todo e os remédios não saibam mal. Tomam os comprimidos religiosamente e comparecem nas consultas. Fazem o que lhes dizem - a menos que o médico sugira mudanças radicais no seu estilo de vida - mas nunca lhes ocorre questionar as decisões do médico ou lançarem-se a fazer eles próprios coisas que «sintam acertadas.» São pessoas que, perante a escolha, preferiam ser operadas a trabalhar activamente para se curarem.
No outro extremo estão os quinze a vinte por cento que são excepcionais. Não estão a fazer testes; estão a ser eles próprios. Recusam-se a desempenhar o papel de vítimas. Quando desempenham esse papel, os doentes não conseguem ajudar-se a si próprios, pois tudo lhes é feito.
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Os doentes excepcionais recusam-se a ser vítimas. Educam-se a si próprios e tornam-se especialistas em cuidar de si próprios. Questionam o médico porque querem compreender o tratamento e participar nele. Exigem dignidade, personalização e controlo, seja qual for o curso da doença.
É preciso coragem para ser excepcional. Lembro-me de uma mulher que, quando lhe disseram que tinha de ir ao serviço de radiologia, respondeu: «Não. Não me explicaram este exame.» Quando os auxiliares lhe disseram: «Pode morrer esta noite se não fizer este exame», ela disse: «Então morro esta noite, mas não saio do quarto.» Apareceu imediatemente alguém para explicar para que servia o exame.
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Os pacientes excepcionais querem saber todos os pormenores dos relatórios das radiografias. Querem saber o que significa cada valor nos relatórios de análises. Um médico que aproveite essa intensa preocupação do próprio em vez de a rejeitar e estar «demasiado ocupado», melhora substancialmente as hipóteses do doente.
Os médicos devem compreender que os doentes que consideram difíceis ou não cooperantes são os que têm maior probabilidade de cura.
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Para saber se detêm actualmente a perspectiva de um doente excepcional, façam a si próprios esta pergunta antes de continuarem a ler: Querem viver até aos cem? Nos ECaP descobrimos que a capacidade de ser um paciente excepcional é correctamente previsível por um «Sim!» imediato e visceral sem ses, nem mas. A maior parte das pessoas dirá: «Bem, sim, desde que garanta que terei saúde.» No entanto, as pessoas que se tornam doentes excepcionais sabem que a vida não vem com essa garantia. Aceitam de boa vontade todos os riscos e desafios. Enquanto estão vivas, sentem que controlam o seu destino e contentam-se em receber alguma felicidade para si próprias e em dar alguma as outros. Têm aquilo que os psicólogos chamam um núcleioo de controlo interior. Não temem o futuro nem acontecimentos externos. Sabem que a felicidade vem de dentro.
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Acho que todos os médicos deviam ser obrigados, como parte da sua formação, a assistir a serviços de cura onde aparecem pessoas com as chamadas doenças incuráveis. Devia dizer-se aos clínicos que não estão autorizados a receitar medicação ou a pensar em operar essas pessoas, mas simplesmente que saiam e as vão ajudar. Assim os médicos aprenderiam que podem ajudar tocando, rezando ou simplesmente partilhando a nível emocional. (1)
bernie s. siegel
(1) SIEGEL, Bernie S. - Amor, medicina e milagres. 1ª ed. Lisboa: Sinais de Fogo, 2004. ISBN 972-8541-47-3. pgs. 45-50.