28.8.14

Cadernos de Gethsemani

1.


desceram das montanhas os primeiros animais, as primeiras aves, as mães que, nas casas
dos filhos, casam e cozem o pão;

desceram das montanhas a flauta e a voz humana,
essa imensa cosmologia
mais breve que o voo de uma libélula
e infinitamente mais silenciosa [ou triste]
que a humana escritura dos deuses.


Jorge Vicente

26.2.14

Transição

3.

é um Canto
ou uma posterior humanidade esta que escreve
"estou aqui",

que habita entre silêncios brancos
entre uma pegada de animal
e um corpo [para sempre animado],

um corpo desejoso de escrita
ou da destreza de um verso:
o-leve-bater de um ofício-ainda-novo:

a ânsia monástica da vivência.

Jorge Vicente

25.2.14

Transição


2.

não tenho biografia. nem um pouco desse ajuntamento fácil de acontecimentos e experiências,
dessa história, dessa memória narrada que me faz a mim [e aos outros poetas]

não tenho nada disso que se chama idade cronológica
idade fértil experiência de vida hora de entrar e sair do poema

não tenho nem nunca tive história
           [e nem posso ter]

porque a posteridade é uma faca que agarra a pele
e a vivência não pode ser deste tempo
nem do outro que passou,

senão duma presença
encorporada em tempo cenestésico
que acende.


Jorge Vicente

18.2.14

Transição


neste livro
o mapa-mundo

uma pele de animal
ausente de palavras.

Jorge Vicente

5.11.13

o movimento humano

(escultura de emilio greco, "grande bagnante II" (s/d)

"A vivência humana é extremamente rica e ampla, a própria linguagem socializada não é por si suficiente para traduzir essa riqueza das impressões vividas (...).

O movimento enriquece a linguagem e o corpo escolhe a palavra. Foi a melodia do gesto que socializou a forma de comunicação não-verbal e verbal (...).

A liberdade do movimento é a mais pura, é mediante ao gesto que a subjectividade alcança a vida. O movimento é a expressão mais sociológica da liberdade individual. A liberdade é uma conquista. É o movimento que possibilita e assegura sucessivamente a autonomia e a independência". (1)

vítor da fonseca

(1) FONSECA, Vítor da Fonseca in GÓIS, Cezar Wagner de Lima - Biodança: identidade e vivência. Fortaleza: Edições Instituto Paulo Freire do Ceará, 2002. p. 100.

17.4.13

yoga de corpo e alma




DIVULGAÇÃO

Para quem busca serenidade e plenitude, tanto no corpo como na mente: Yoga de corpo e alma!
Talvez uma ponte entre a poesia das palavras e a poesia do corpo, onde escutar o nosso coração e deixar fluir livremente a energia é fundamental!
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11.4.13

polly jean



(desenho de polly jean harvey feito por grozdana tilotta, retirado daqui)



polly jean tinha um pequeno pássaro
que voava um pouco acima dos seus olhos:
dizia-lhe segredava-lhe bem junto aos
versos que o poeta não tem nome.
quando nasce, amanhece junto à
janela que fica ao bordo do cais,
perto dos bares, dos botequins da
cidade velha (não havia palavras
nessa altura, apenas o silêncio da
palavra pai ou da palavra mãe).

polly jean escrevia e o pequeno pássaro
sentava-se junto ao trono. um pequeno
pedaço de madeira que ornamentava
a cama desarrumada e os olhos desfeitos.
para onde olhas, para onde escreves
e por onde o teu corpo passa. junto à
cidade, há apenas cadeiras onde nos
podemos sentar e mesas vazias
onde te podes esconder do
rosto das pessoas.

o pássaro cantava e apenas uma
sombra alumiava o quarto: poderíamos
dizer que na cidade anoitecia e que a
liturgia dos pequenos corpos e das
grandes pessoas alumiava o espanto
dos poetas. se eu puder amar (escreveu
polly jean no seu diário de maio de noventa
e oito), traz-me um bocado de pele
para eu brincar ao amor.

jorge vicente